Pôster do filme “Criação” (Creation) - baseado no livro “Annie’s Box”, escrito por Randal Reynes, tataraneto de Charles Darwin, o criador da teoria da evolução.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Desonestidade “intelectual”, um desabafo e um devaneio.

Hoje estava lendo a Nature. É um exercício que faço sempre que possível. Pra quem não sabe, a Nature é a revista científica mais ultra-duper-blaster de ciência do mundo, publicando artigos e matérias fresquinhas, que acabaram de sair de grupos de pesquisa fodões, e praticamente tudo que sai na Nature tem um impacto fodástico para a sociedade.

A dessa semana trás como matéria da capa as descobertas feitas pelo satélite Kepler, que em pouco mais de um ano de funcionamento já deu uma voadora na cara dos cientistas ao mostrar um número grande de planetas extra-solares, muitos deles em zonas habitáveis (propícias a vida) e pelo menos 5 deles do tamanho da Terra.

Mas outra matéria também me chamou muita atenção. Novas descobertas arqueológicas mostrando várias possíveis rotas pelas quais o Homo Sapiens saiu da África, há algo em torno de 100000 anos atrás. A matéria é excelentemente escrita, e cautelosa, no sentido de explicar o que foi encontrado, onde foi encontrado, como os cientistas calcularam a idade, e como chegaram as conclusões que chegaram.

Algo extremamente bonito é a integração entre campos totalmente distintos. Biologia molecular, arqueologia, geologia, antropologia, genética, tudo isso agindo em conjunto, e se desafiando, para deixar de pé somente as idéias que sobrevivem a todos os testes, e se fundamentam em um número suficiente de evidências.

Apesar de fascinante, matérias assim são comuns. Eu fico pessoalmente encantado com tais descobertas “interdisciplinares”, pois carregam aquilo que a ciência tem de mais bonito. Se uma descoberta arqueológica não bate com algum fato geológico, ou biológico, alguém está errado. E a análise para se chegar na conclusão consistente com todos os campos não é nada trivial.

Eu posso imaginar os cientistas envolvidos, organizando conferências, trocando e-mails com de outras áreas, viajando para universidades para aprender mais sobre as conclusões do outro grupo, e assim vai.

Agora vem a parte que é triste ter que falar, mas necessário.

Como muitos sabem, existem pessoas que não “acreditam” na ciência. Isso é até perdoável, quando essas pessoas não tem educação. Afinal, eu não espero que pessoas sem o segundo grau completo se interessem ou sequer entendam o que está escrito na Nature.

O que realmente me incomoda são pessoas que se dizem cientistas, e tem coragem de dizer absurdos grotescos como “não existem evidências para a evolução” ou “não existem evidências para a idade da Terra de 4 bilhões de anos”. Pessoas assim com certeza NUNCA abriram uma revista como a Nature ou Science. Nunca se sentiu maravilhado com as conquistas da humanidade. Nunca deu valor ao que já conquistamos, e aos inúmeros desafios que ainda temos pela frente.

Coloquei o “intelectual” entre parênteses no título, pois tais pessoas, ainda que carreguem um título de mestre ou bacharel, não possuem intelecto. Ou se possuem, é inteiramente voltado para a mentira e desonestidade.

Atualmente os mestres nisso são os ditos “criacionistas”. Há quem confunda criacionismo com religião. Não é. Não lida com valores morais como a maioria das religiões faz. Há quem iludidamente ache que criacionismo é ciência. Um “cientista criacionista” é a mesma coisa que um “cientista astrólogo”.

Pra quem não sabe, “cientistas criacionistas” são pessoas com títulos acadêmicos que inventam mentiras cabeludas pra dizer absurdos como “os homens andaram junto com dinossauros”, “a Terra tem em torno de 6 mil anos de idade” e “todos os animais do mundo foram criados magicamente no mesmo dia”. Eles não possuem nenhuma evidência para tais alegações, mas pelo simples fato de terem um título acadêmico as pessoas acreditam no que eles inventam.

Só pra enfatizar, não existe um ÚNICO trabalho científico que comprove alguma das alegações acima. Não existe um ÚNICO dado incompatível com a evolução das espécies vivas na Terra.

E eu fico profundamente triste e revoltado com isso, pois sou um apaixonado pela ciência, como já disse. Seria como um médico ver alguém com um diploma de medicina tratando pessoas por sangria e lobotomia, e dizendo que toda a medicina moderna está errada.

Enfim, é extremamente angustiante ver isso acontecer, e ver pessoas caindo na onda dessas pessoas. E não, não tem nada a ver com religião. Acreditar em Deus não significa, em momento algum, ter que acreditar literalmente num livro escrito há 2 mil anos atrás, quando as pessoas não sabiam porque chovia, ou o que eram doenças, que dirá sobre tectônica de placas ou cosmologia. Escolher acreditar literalmente num livro velho não é ser fiel a Deus, mas fiel a pessoa que te disse pra ser assim (a mesma pessoa que cobra dízimos e vende DVDs e livros dizendo absurdos científicos).

Então sim, sempre que eu souber de alguém que acredita em alegações INFUNDADAS e MENTIROSAS a respeito de ciência, eu vou falar. Acho que é meu dever, como possível futuro cientista.

Se essas pessoas pudessem compreender a beleza da realidade! E o esforço da humanidade em tentar descobrir mais sobre essa realidade! Há 100 mil anos atrás estávamos lutando pela sobrevivência, procurando comida, e começando a nos espalhar pelo globo. Hoje estamos aqui, olhando para o cosmos, olhando para outros planetas semelhantes ao nosso, e nos perguntando que tipo de vida existe por lá. Olhamos para o nosso passado, ao mapear a rota que nossos antepassados fizeram, e os desafios que eles encontraram. Ao traçar a linha evolutiva da espécie que hoje chamamos de humana, e cada vez compreendemos mais que não somos tão diferentes assim dos nossos primos mais próximos, Bonobos e Chimpanzés. Ao ver sistemas planetários em formação, e tentar entender como o nosso próprio se formou. Ao ver galáxias jovens, e tentar entender mais sobre a nossa via-láctea. Ao olhar para o cosmos como o todo, e ver toda a sua história alcançável e compreensível aos nossos pequenos cérebros de macaco.

E há quem diga que tudo isso é mentira…
.
http://ddimensoes.wordpress.com/

1 comentários:

Christofer Magalhães Castro disse...

Pois é Breno.
Penso o mesmo.
O povo confunde erudição com inteligência.
Há alguns que estudaram tanto que não conseguem mais pensar analiticamente.
Sou advogado, aqui no escritório está cheio destes tipos!

abs

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